Cinco décadas de
abandono nas ferrovias e as viagens de trem no Brasil praticamente
acabaram. O que era um projeto de integração nacional virou sucata. É o
que você vai ver em uma série especial que o Bom Dia Brasil exibe.
Faz quase 30 anos que o
último passageiro foi embora, mas, por incrível que pareça, a porta
continua aberta. E ainda tem barulho de trem. Sonho? Delírio? Nada
disso. O trem se aproxima e a gente acaba descobrindo que a velha
estação serve como pátio de manobra para locomotivas de carga.
O que sobrou da
belíssima Estação Vitória? Não tem mais nada dos vagões que faziam
viagens românticas e luxuosas até o Rio de Janeiro. Dá para imaginar uma
sala de espera, uma parte administrativa da estação, mas está tudo
pichado. Móveis largados, destruídos. Na verdade, a estação é um retrato
do que aconteceu com os trens de passageiros no Brasil.
Em Cordeirópolis, no
interior de São Paulo, o trem passa levando carga. E não para. A
sensação é de estar visitando os escombros, as ruínas de um grande
projeto de integração nacional por meio de trens de passageiros. Isso
quase aconteceu, mas já faz muito tempo.
O mapa de 1954 mostra
como os trens de passageiros ligavam o litoral e o interior,
principalmente no Sudeste e no Nordeste do Brasil, mas também no Norte e
no Sul. No auge, nos anos 60, eram mais de 37 mil quilômetros de
ferrovias fazendo pelo menos uma parte do que hoje se faz de ônibus,
carro ou avião.
Depois de 16 anos
estudando a história dos trens no Brasil, Ralph Guisbrert concluiu que o
maior problema foi o sucateamento da linha férrea durante a Segunda
Guerra Mundial. “As pessoas mais ricas, que eram quem sustentava os
trens de passageiros, rapidamente largaram os trens de passageiro e
começaram a andar de avião, de carros, que já chegavam cada vez mais
baratos. Então começou a cair manutenção dos trens, das vias, das
estações”, explica.
Pouco a pouco, o que
sobrou da Ferrovia Paulista foi se juntando ao que sobrou da Rede
Ferroviária Federal para formar um grande ferro-velho nacional. São 5,7
mil vagões e locomotivas enferrujando, apodrecendo e atrapalhando.
Um galpão, no interior
de São Paulo, guarda só uma parte da herança incômoda deixada há 15 anos
pela rede federal para as concessionárias privadas, que agora operam os
trens de carga no país. As empresas são obrigadas a cuidar da sucata e
não podem tirar um único parafuso da mistura de lixo e relíquias.
O vagão escuro é
sinônimo de um luxo que já não existe mais no Brasil. Foi o vagão
dormitório de um trem de passageiro. Nele, um armário, uma cama dobrável
com um vaso sanitário embaixo.
Na Grande São Paulo,
existem mais de 300 vagões largados, ocupando o equivalente a sete
quilômetros de trilhos. “Esses troços atrapalham a gente, porque eu
poderia tirar um trem para ele entrar em operação, mas eu topo com isso
aqui. O custo é: nós temos segurança. Se o segurança não está aqui no
horário eles entram, botam fogo, como aconteceu”, explica Evaldo
Ferreira, gerente-geral de manutenção da CPTM.
Só este ano foram oito
vagões incendiados por invasores. Por email, a Agência Nacional de
Transportes Terrestres disse que o material que pertencia à antiga RFFSA
está sendo incorporado ao Departamento Nacional de Infraestrutura de
Transportes, o DNIT, e que ainda passa por um processo de levantamento.
“Esses trens estão aqui há mais de 30 anos”, afirma Evaldo Ferreira.
“Esse material é
inservível. Vai ser leiloado, vai ser vendido como sucata. Isso não tem
data. Pode levar 5, 8, 10 anos”, explica Marcelo Perrupato, secretário
de Política Nacional de Transportes.
E assim, por uma
daquelas questões de inexplicável burocracia, o investimento astronômico
feito no passado continua jogado nos galpões ao sabor dos ventos.
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